domingo, 1 de fevereiro de 2015

A SAGRADA ESCRITURA: O VERBO,

  • A SAGRADA ESCRITURA: O VERBO, INSPIRAÇÃO E VERDADE, A INTERPRETAÇÃO DA ESCRITURA 101-119 INTRODUÇÃO


A Escritura (Antigo e Novo Testamento) é o tema principal dos parágrafos que vamos estudar. Como conjunto de escritos sagrados inspirados por Deus, a Bíblia é o registro estável e normativo para todos os tempos da fé hebraica e cristã. É inegável a importância da Escritura para vida cristã. Vale a pena recordar que a expressão “Palavra de Deus” (Dei Verbum) indica primeiramente não a Escritura (a palavra escrita), mas o próprio evento da revelação. Ora, esse acontecimento admirável brilha para nós em Cristo que é a plenitude de tal revelação divina (cf. DV 2). Por isso, ao falar da Escritura, o Catecismo começa com o tema “Cristo: Palavra única da Sagrada Escritura”. A Revelação antes de ser Escritura é evento e acontecimento. Isso nos faz compreender “por que motivo, na Igreja, veneramos extremamente as Sagradas Escrituras, apesar da fé cristã não ser uma „religião do Livro‟: o cristianismo é a „religião da Palavra de Deus‟, não de „uma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo” (VD 7). Essa “concentração cristológica” da revelação não diminui em nada o respeito devido às Sagradas Escrituras. A Bíblia é Palavra de Deus porque inspirada por Deus, ou seja, foi o Espírito Santo que agiu na sua elaboração. Nesse ponto, o Catecismo estabelece uma relação importante entre o fato da inspiração e a interpretação da Escritura. A Escritura deve ser lida e interpretada no mesmo Espírito em que ela fo

i escrita (cf. DV 12,3)

Esse critério parece evidente e pressuposto: se a Escritura é inspirada pelo Espírito Santo, é evidente que deva ser interpretada segundo o mesmo Espírito. Infelizmente o que é pressuposto, nem sempre é o que ocorre na prática. Prova disso são os exemplos de instrumentalização da Bíblia, de interpretações tendenciosas e unilaterais que hoje parecem se multiplicar.


Atenção ao termo “Palavra de Deus”

Quando usamos e ouvimos a expressão “Palavra de Deus” é preciso estar atento aos diversos significados que ela assume sem deixar de relacionar esses significados entre si A diversidade de significados que o termo “Palavra de Deus” possui não significa confusão nem contradição. Pelo contrário, indica tanto a riqueza quanto a convergência dos diversos significados. Para aprofundar, leia e reflita o texto a seguir (grifo nosso). O Logos (Palavra, Verbo) indica originariamente o Verbo eterno, ou seja, o Filho unigênito, gerado pelo Pai antes de todos os séculos e consubstancial a Ele: “o Verbo estava junto de Deus, o Verbo era Deus”. Mas este mesmo Verbo (...) “Se fez carne” (Jo 1, 14). Assim a expressão “Palavra de Deus” acaba por indicar a pessoa de Jesus Cristo, Filho eterno do Pai feito homem. Além disso, se no centro da revelação divina está o acontecimento de Cristo, é preciso reconhecer que a própria criação, o liber naturae (livro da natureza), constitui também essencialmente parte da sinfonia a diversas vozes na qual Se exprime o único Verbo. Do mesmo modo confessamos que Deus comunicou a sua Palavra na história da salvação, fez ouvir a sua voz; com a força do seu Espírito, «falou pelos profetas». Por conseguinte, a Palavra divina exprime-se ao longo de toda a história da salvação e tem a sua plenitude no mistério da encarnação, morte e ressurreição do Filho de Deus. E Palavra de Deus é ainda aquela pregada pelos Apóstolos, em obediência ao mandato de Jesus Ressuscitado: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a criatura” (Mc 16,15). Assim a Palavra de Deus é transmitida na Tradição viva da Igreja. Enfim, é Palavra de Deus, atestada e divinamente inspirada, a Sagrada Escritura, Antigo e Novo Testamento (Verbum


  • TEXTO 101-119 CAPÍTULO SEGUNDO DEUS VEM AO ENCONTRO DO HOMEM ARTIGO 3 A SAGRADA ESCRITURA

I. Cristo – Palavra única da Escritura santa 101. Na sua bondade condescendente, para Se revelar aos homens. Deus fala-lhes em palavras humanas: «As palavras de Deus, com efeito, expressas por línguas humanas, tornaram-se semelhantes à linguagem humana, tal como outrora o Verbo do eterno Pai se assemelhou aos homens assumindo a carne da debilidade humana» (DV 13). 102. Através de todas as palavras da Sagrada Escritura. Deus não diz mais que uma só Palavra, o seu Verbo único, em quem totalmente Se diz (cf. Hb 1,1-3): «Lembrai-vos de que o discurso de Deus que se desenvolve em todas as Escrituras é um só e um só é o Verbo que Se faz ouvir na boca de todos os escritores sagrados, o qual, sendo no princípio Deus junto de Deus, não tem necessidade de sílabas, pois não está sujeito ao tempo» (Santo Agostinho, Enarratio in Psalmum 103,4,1: CCL 40,1521). 103. Por esta razão, a Igreja sempre venerou as divinas Escrituras tal como venera o Corpo do Senhor. Nunca cessa de distribuir aos fiéis o Pão da vida, tornado à mesa quer da Palavra de Deus, quer do Corpo de Cristo (DV 21). 104. Na Sagrada Escritura, a Igreja encontra continuamente o seu alimento e a sua força (DV 24), porque nela não recebe apenas uma palavra humana, mas o que ela é na realidade: a Palavra de Deus (cf. 1Ts 2,13). «Nos livros sagrados, com efeito, o Pai que está nos Céus vem amorosamente ao encontro dos seus filhos, a conversar com eles»



O ESTIRITU SANTO 


II. Inspiração e verdade da Sagrada Escritura 105. Deus é o autor da Sagrada Escritura. «A verdade divinamente revelada, que os livros da Sagrada Escritura contêm e apresentam, foi registrada neles sob a inspiração do Espírito Santo». «Com efeito, a santa Mãe Igreja, segundo a fé apostólica, considera como sagrados e canônicos os livros completos do Antigo e do Novo Testamento com todas as suas partes, porque, escritos por inspiração do Espírito Santo, têm Deus por autor, e como tais foram confiados à própria Igreja» (DV 11). 106. Deus inspirou os autores humanos dos livros sagrados. «Para escrever os livros sagrados, Deus escolheu e serviu-se de homens, na posse das suas faculdades e capacidades, para que, agindo Ele neles e por eles, pusessem por escrito, como verdadeiros autores, tudo aquilo e só aquilo que Ele queria» (DV 11). 107. Os livros inspirados ensinam a verdade. «E assim como tudo o que os autores inspirados ou hagiógrafos afirmam, deve ser tido como afirmado pelo Espírito Santo, por isso mesmo se deve acreditar que os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro, a verdade que Deus quis que fosse consignada nas sagradas Letras em ordem à nossa salvação» (DV 11). 108. No entanto, a fé cristã não é uma «religião do Livro». O Cristianismo é a religião da «Palavra» de Deus, «não duma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo» (São Bernardo de Claraval, Homilia super "Missus est" 4,11). Para que não sejam letra morta, é preciso que Cristo, Palavra eterna do Deus vivo, pelo Espírito Santo, nos abra o espírito à inteligência das Escrituras (cf. Lc 24,45

III. O Espírito Santo, intérprete da Escritura 109. Na Sagrada Escritura, Deus fala ao homem à maneira dos homens. Portanto, para bem interpretar a Escritura, é necessário prestar atenção ao que os autores humanos realmente quiseram dizer, e àquilo que aprouve a Deus manifestar-nos pelas palavras deles (DV 12). 110. Para descobrir a intenção dos autores sagrados, é preciso ter em conta as condições do seu tempo e da sua cultura, os «gêneros literários» em uso na respectiva época, os modos de sentir, falar e narrar correntes naquele tempo. «Porque a verdade é proposta e expressa de modos diversos, em textos históricos de vária índole, ou proféticos, ou poéticos ou de outros gêneros de expressão» (DV 12). 111. Mas, uma vez que a Sagrada Escritura é inspirada, existe outro princípio de interpretação reta, não menos importante que o anterior, e sem o qual a Escritura seria letra morta: «A Sagrada Escritura deve ser lida e interpretada com o mesmo espírito com que foi escrita» (DV 12). O II Concílio do Vaticano indica três critérios para uma interpretação da Escritura conforme ao Espírito que a inspirou (DV 12): 112. 1. Prestar grande atenção «ao conteúdo e à unidade de toda a Escritura». Com efeito, por muito diferentes que sejam os livros que a compõem, a Escritura é una, em razão da unidade do desígnio de Deus, de que Jesus Cristo é o centro e o coração, aberto desde a sua Páscoa (df. Lc 24, 25-27.44-46). «Por coração (Sl 22,15) de Cristo entende-se a Sagrada Escritura que nos dá a conhecer o coração de Cristo. Este coração estava fechado antes da Paixão, porque a Escritura estava cheia de obscuridades. Mas a Escritura ficou aberta depois da Paixão e assim, aqueles que desde então a consideram com inteligência, discernem o modo como as profecias devem ser interpretadas» (São Tomás de Aquino, Expositio in Psalmos, 21,11). 113. 2. Ler a Escritura na «tradição viva de toda a Igreja». Segundo uma sentença dos Padres,«Sacra Scriptura principalius est in corde Ecclesiae quam in materialibus instrumentis scripta» – «A Sagrada Escritura está escrita no coração da Igreja, mais do que em instrumentos materiais» (cf. Santo Hilário de Poitiers, Liber ad Constantium Imperatorem 9: CSEL 65,204; São Jerônimo, Commentarius in epistulam ad Galatas I 1,11-12: PL 26,347). Com efeito, a Igreja conserva na sua Tradição a memória viva da Palavra de Deus, e é o Espírito Santo que lhe dá a interpretação espiritual da Escritura («secundum spiritualem sensum quem Spiritus donat Ecclesiae» «segundo o sentido espiritual que o Espírito Santo dá à Igreja») (Orígenes, Homiliae in Leviticum 5,5: SC

                                                    A SUA FÉ

 114. 3. Estar atento «à analogia da fé» (cf. Rm 12,6). Por «analogia da fé» entendemos a coesão das verdades da fé entre si e no projeto total da Revelação. OS SENTIDOS DA ESCRITURA 115. Segundo uma antiga tradição, podemos distinguir dois sentidos da Escritura: o sentido literal e o sentido espiritual, subdividindo-se este último em sentido alegórico, moral e anagógico. A concordância profunda dos quatro sentidos assegura a sua riqueza à leitura viva da Escritura na Igreja: 116. O sentido literal. É o expresso pelas palavras da Escritura e descoberto pela exegese segundo as regras da reta interpretação. «Omnes sensus fundantur super litteralem» – «Todos os sentidos (da Sagrada Escritura) se fundamentam no literal» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae I, q.1, a.10, adI). 117. O sentido espiritual. Graças à unidade do desígnio de Deus, não só o texto da Escritura, mas também as realidades e acontecimentos de que fala, podem ser sinais. 1. O sentido alegórico. Podemos adquirir uma compreensão mais profunda dos acontecimentos, reconhecendo o seu significado em Cristo: por exemplo, a travessia do Mar Vermelho é um sinal da vitória de Cristo e, assim, do Baptismo (cf. 1Cor 10,2). 2. O sentido moral. Os acontecimentos referidos na Escritura podem conduzir-nos a um comportamento justo. Foram escritos «para nossa instrução» (1Cor 10,11; cf. Hb 3- 4,11). 3. O sentido anagógico. Podemos ver realidades e acontecimentos no seu significado eterno, o qual nos conduz (em grego: «anagoge») em direção à nossa Pátria. Assim, a Igreja terrestre é sinal da Jerusalém celeste (cf. Ap 21,1-22,5). 118. Um dístico medieval resume a significação dos quatro sentidos: «Littera gesta docet, quid credas allegoria. Moralis quid agas, quo tendas anagogia». «A letra ensina-te os factos (passados), a alegoria o que deves crer, a moral o que deves fazer, a anagogia para onde deves tender» (Agostinho de Dácia, Rotulus pugillaris, I). 119. «Cabe aos exegetas trabalhar, de harmonia com estas regras, por entender e expor mais profundamente o sentido da Sagrada Escritura, para que, mercê deste estudo, de algum modo preparatório, amadureça o juízo da Igreja. Com efeito, tudo quanto diz respeito à interpretação da Escritura, está sujeito ao juízo último da Igreja, que tem o divino mandato e o ministério de guardar e interpretar a Palavra de Deus» (DV 12): «Ego vero Evangelio non crederem, nisi me catholicae Ecclesiae commoveret auctoritas» – «Quanto a mim, não acreditaria no Evangelho se não me movesse a isso a autoridade da Igreja católica» (Santo Agostinho, Contra Epistulam Manichaei quam



                        REVISANDO TEMAS

1. Inspiração e verdade Cristo está no centro e é o princípio da unidade da Sagrada Escritura porque, nas palavras escritas, ressoa a Palavra única que é o próprio Cristo. Por isso, se quisermos ter acesso à revelação divina é preciso ir ao homem Jesus, o Verbo encarnado. O coração de Deus é revelado pelo coração humano de Jesus. Mas a plenitude da revelação, presente em Jesus Cristo, poder ser descoberta por nós somente através da mediação da Escritura. Assim todo esforço que fazemos para conhecer a Sagrada Escritura está finalizado a conhecer o próprio Cristo. Como é possível que um escrito nos abra o acesso à pessoa de Cristo? Isso só é possível porque o Espírito Santo inspirou a Escritura. Com efeito, os livros da Escritura são normativos para a Igreja (recebe deles a sua regra de vida) e possuem um caráter sagrado para ela (por isso são “Sagrada Escritura”) exatamente porque foram escritos por inspiração do Espírito Santo. A doutrina da Inspiração bíblica não deve ser confundida com fenômenos semelhantes à psicografia. Os escritores humanos escreveram, de fato, sob a atuação do Espírito Santo, como autores genuínos e não como meros estenógrafos inconscientes que escreveriam o que foi ditado por Deus. Inspiração é o impulso especial e a orientação do Espírito Santo mediante o qual foram compostos os livros da Sagrada Escritura que por isso podem ser chamados “Palavra de Deus” (cf. Jo 20,31; 2Tm 3,16; 2Pd 1,19-21; 3,15-16;

Atenção ao termo: Psicografia. Em espiritismo, é a faculdade dos médiuns, sob a atuação de espíritos comunicantes, escreverem com a própria mão ou, conforme o desenvolvimento mediúnico, com ambas as mãos ao mesmo tempo. O médium não toma nenhum conhecimento do que escreve e às vezes enquanto o faz, conversa com os assistentes. A Inspiração bíblica é portanto um carisma específico. Primeiramente é um impulso a escrever. De fato, o Espírito pode impelir para muitas coisas: para agir, rezar e falar; pode discernir e julgar; pode revelar coisas futuras etc. Mas chamamos de inspiração 



bíblica somente o carisma ligado a escrever. Além disso, o carisma da Inspiração bíblica é o que garante que o escrito é querido por Deus e por isso pode ser chamado de “Palavra de Deus”. O influxo do Espírito Santo sobre os hagiógrafos, porém, não absorve nem destrói a ação dos autores humanos, antes os assume. Por isso os autores inspirados são autores genuínos e não meros instrumentos passíveis e extrínsecos da ação do Espírito. O carisma da Inspiração bíblica, por fim, continua na Igreja não no senso de que mais livros inspirados possam ser ainda escritos (o número de livros sacros está definitivamente fechado), mas no sentido de que o mesmo Espírito Santo, que inspirou os livros sagrados, continua a agir na Igreja para a sua reta interpretação e atualização. Assim a aceitação de que a Bíblia é inspirada por Deus (e por isso é Palavra de Deus) obriga os cristãos a interpretá-la e a atualizá-la. Ignorar ou esquecer isso, significa cair na leitura fundamentalista da Bíblia. O que é leitura fundamentalista da Bíblia? Para entender isso, leia o texto da Pontifícia Comissão Bíblica, A Interpretação da Bíblia na Igreja, Vaticano, 1993. O texto integral pode ser encontrado em: http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith _doc_19930415_interpretazione_po.html. O negrito é nosso. A leitura fundamentalista parte do princípio de que a Bíblia, sendo Palavra de Deus inspirada e isenta de erro, deve ser lida e interpretada literalmente em todos os seus detalhes. Mas por “interpretação literal” ela entende uma interpretação primária, literalista, isto é, excluindo todo esforço de compreensão da Bíblia que leve em conta seu crescimento histórico e seu desenvolvimento. Ela se opõe assim à utilização do método histórico-crítico, como de qualquer outro método científico, para a interpretação da Escritura. A leitura fundamentalista teve sua origem na época da Reforma, com uma preocupação de fidelidade ao sentido literal da Escritura. Após o século das Luzes, ela se apresentou no protestantismo como uma proteção contra a exegese liberal. O termo “fundamentalista” é ligado diretamente ao Congresso Bíblico Americano realizado em Niagara, Estado de New York, em 1895. Os exegetas protestantes conservadores definiram nele “cinco pontos de fundamentalismo”: a inerrância verbal da Escritura, a divindade de Cristo, seu nascimento virginal, a doutrina da expiação vicária e a ressurreição corporal quando da segunda vinda de Cristo. Logo que a leitura fundamentalista da Bíblia se propagou em outras partes do mundo ela fez nascer outras espécies de leituras, igualmente “literalistas”, na Europa, Ásia, África e América do Sul. Esse gênero de leitura encontra cada vez mais adeptos, no decorrer da última parte do século XX, em grupos religiosos e seitas assim como também entre os católicos. Se bem que o fundamentalismo tenha razão em insistir sobre a inspiração divina da Bíblia, a inerrância da Palavra de Deus e as outras verdades bíblicas inclusas nos cinco pontos fundamentais, sua maneira de apresentar essas verdades está enraizada em uma ideologia que não é bíblica, apesar do que dizem seus representantes. Ela exige uma forte adesão a atitudes doutrinárias rígidas e impõe, como fonte única de ensinamento a respeito da vida cristã e da salvação, uma leitura da Bíblia que recusa todo questionamento e toda pesquisa crítica.


O problema de base dessa leitura fundamentalista é que recusando de levar em consideração o caráter histórico da revelação bíblica, ela se torna incapaz de aceitar plenamente a verdade da própria Encarnação. O fundamentalismo foge da estreita relação do divino e do humano no relacionamento com Deus. Ele se recusa em admitir que a Palavra de Deus inspirada foi expressa em linguagem humana e que ela foi redigida, sob a inspiração divina, por autores humanos cujas capacidades e recursos eram limitados. Por esta razão, ele tende a tratar o texto bíblico como se ele tivesse sido ditado palavra por palavra pelo Espírito e não chega a reconhecer que a Palavra de Deus foi formulada em uma linguagem e uma fraseologia condicionadas por uma ou outra época. Ele não dá nenhuma atenção às formas literárias e às maneiras humanas de pensar presentes nos textos bíblicos, muitos dos quais são fruto de uma elaboração que se estendeu por longos períodos de tempo e leva a marca de situações históricas muito diversas. O fundamentalismo insiste também de uma maneira indevida sobre a inerrância dos detalhes nos textos bíblicos, especialmente em matéria de fatos históricos ou de pretensas verdades científicas. Muitas vezes ele torna histórico aquilo que não tinha a pretensão de historicidade, pois ele considera como histórico tudo aquilo que é reportado ou contado com os verbos em um tempo passado, sem a necessária atenção à possibilidade de um sentido simbólico ou figurativo. O fundamentalismo tem muitas vezes tendência a ignorar ou a negar os problemas que o texto bíblico comporta na sua formulação hebraica, aramaica ou grega. Ele é muitas vezes estreitamente ligado a uma tradição determinada, antiga ou moderna. Ele se omite igualmente de considerar as “releituras” de certas passagens no interior da própria Bíblia. No que concerne os Evangelhos, o fundamentalismo não leva em consideração o crescimento da tradição evangélica, mas confunde ingenuamente o estágio final desta tradição (o que os evangelistas escreveram) com o estágio inicial (as ações e as palavras do Jesus da história). Ele negligencia assim um dado importante: a maneira com a qual as próprias primeiras comunidades cristãs compreenderam o impacto produzido por Jesus de Nazaré e sua mensagem. Ora, aqui está um testemunho da origem apostólica da fé cristã e sua expressão direta. O fundamentalismo desnatura assim o apelo lançado pelo próprio Evangelho. O fundamentalismo tem igualmente tendência a uma grande estreiteza de visão, pois ele considera conforme a realidade uma antiga cosmologia já ultrapassada, só porque encontra-se expressa na Bíblia; isso impede o diálogo com uma concepção mais ampla das relações entre a cultura e a fé. Ele se apoia sobre uma leitura não-crítica de certos textos da Bíblia para confirmar ideias políticas e atitudes sociais marcadas por preconceitos, racistas, por exemplo, simplesmente contrários ao Evangelho cristão. Enfim, em sua adesão ao princípio do “sola Scriptura”, o fundamentalismo separa a interpretação da Bíblia da Tradição guiada pelo Espírito, que se desenvolve autenticamente em ligação com a Escritura no seio da comunidade de fé. Falta-lhe entender que o Novo Testamento tomou forma no interior da Igreja cristã e que ele é Escritura Santa desta Igreja, cuja existência precedeu a composição de seus textos. Assim, o fundamentalismo é muitas vezes anti-eclesial; ele considera negligenciáveis os credos, os dogmas e as práticas litúrgicas que se tornam parte da tradição eclesiástica, como também a função de ensinamento da própria Igreja. Ele se apresenta como uma forma de interpretação privada, que não reconhece que a Igreja é fundada sobre a Bíblia e tira sua vida e sua inspiração das Escrituras.



A abordagem fundamentalista é perigosa, pois ela é atraente para as pessoas que procuram respostas bíblicas para seus problemas da vida. Ela pode enganá-las oferecendo-lhes interpretações piedosas mas ilusórias, ao invés de lhes dizer que a Bíblia não contém necessariamente uma resposta imediata a cada um desses problemas. O fundamentalismo convida, sem dizê-lo, a uma forma de suicídio do pensamento. Ele coloca na vida uma falsa certeza, pois ele confunde inconscientemente as limitações humanas da mensagem bíblica com a substância divina dessa mensagem. Leia também VD 44. Uma vez que a Bíblia é inspirada por Deus, é preciso crer, em consequência, “que os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro, a verdade que Deus quis que fosse consignada nas sagradas Letras em ordem à nossa salvação” (DV 11). Tudo na Escritura está relacionado com a Revelação que tem como finalidade a nossa salvação. Deus se revela para nos oferecer a comunhão com Ele e nisso consiste a nossa salvação. A revelação não tem a finalidade de nos comunicar “curiosidades” ou “informações” sobre Deus. A revelação está finalizada e se identifica com a nossa salvação. Da mesma maneira, a Bíblia está orientada à nossa salvação. Assim a verdade que a Bíblia nos comunica é a verdade salvífica, ou seja, nela podemos encontrar de maneira indubitável os desígnios de Deus para a nossa salvação: as suas exigências, os seus mandamentos, as suas iniciativas de perdão e de salvação. A verdade da Escritura é portanto a capacidade que a Bíblia tem, em virtude da sua origem divina (=inspiração), de nos transmitir toda a verdade concernente ao plano salvífico de Deus para o homem de todos os tempos. Mesmo que ela nos comunique a verdade salvadora, a Bíblia permanece um conjunto de escritos de um determinado tempo da história. Ela é Palavra de Deus, sem deixar de ser expressa em palavras humanas condicionadas a um tempo e lugar. Como palavra humana condicionada, a Bíblia pode conter concepções que não são mais as nossas. Por isso podemos encontra na Bíblia alguns “erros” (preste atenção nas aspas!) do ponto de vista da historiografia ou da ciência moderna. Isso não fere em nada o fato de que a Bíblia ensine a verdade, uma vez que informações historiográficas ou científicas não eram nem são o objetivo visado pela Bíblia.

 2. Interpretação Para interpretar o texto bíblico é preciso ter consciência da sua origem divina. “Sem fé não há chave de acesso ao texto sagrado (...) „A letra do Evangelho também mata, se faltar a graça interior da fé que cura‟” (VD 29). Por outro lado, não se deve esquecer que a Sagrada Escritura, enquanto obra inspirada, é ao mesmo tempo produção literária de homens. Por isso deve-se ter presente os gêneros literários e as condições da época e da cultura dos autores sagrados. A Bíblia é uma obra inserida na história e um texto do passado; testemunha pessoas e doutrinas de séculos e milênios passados. Ela foi composta por superposição e por fusão de muitos outros escritos anteriores. A Bíblia pode ser comparada a um mar formado de muitas águas confluentes. As pesquisas histórico-críticas revelam que a Bíblia tem uma longa e complexa história. A interpretação bíblica, no entanto, não pode parar nesse estágio. Mesmo que reconheçamos a Escritura como um texto do passado, não devemos considerá-la engolida pela história. A Bíblia é Palavra viva e continuará a falar a todas as gerações.


Ela está inserida na história e ao mesmo tempo a supera e a transcende. A Bíblia é um texto que vem do passado, mas transcende as épocas da história porque se refere constantemente ao mistério imutável e imperscrutável de Deus. O texto bíblico não deve ser estudado somente em sua referência histórica e geográfica, literária e ambiental. Estudamos a Bíblia para descobrir o valor espiritual perene presente nela. A interpretação “espiritual” da Bíblia não deve ser entendida como piedosa elevação ascética, mas como descoberta das grandes atitudes que a sua mensagem nos conduz ou exige de nós: o arrependimento, a conversão do coração, a busca do Reino de Deus, o abandono confiante na fé, a pobreza evangélica, o dom de si aos outros, a superação da morte, a alegria na perseguição, a esperança no Deus que vem. A Bíblia é um dom de Deus à Igreja: segundo o desígnio de Deus, a Igreja recebe a Escritura como parte integrante de si mesma e como realidade que a constituiu. Em outras palavras, a Igreja nasce e se constitui recebendo a Escritura. Por isso, “o lugar originário da interpretação da Escritura é a vida da Igreja. Esta afirmação não indica a referência eclesial como um critério extrínseco ao qual se devem submeter os exegetas, mas é uma exigência da própria realidade das Escrituras e do modo como se formaram ao longo do tempo. De fato, as tradições de fé formavam o ambiente vital onde se inseriu a atividade literária dos autores da Sagrada Escritura. Esta inserção englobava também a participação na vida litúrgica e na atividade externa das comunidades, no seu mundo espiritual, na sua cultura e nas vicissitudes do seu destino histórico. Por isso, de modo semelhante, a interpretação da Sagrada Escritura exige a participação dos exegetas em toda a vida e em toda a fé da comunidade crente do seu tempo. Por conseguinte, devendo a Sagrada Escritura ser lida e interpretada com o mesmo Espírito com que foi escrita, é preciso que os exegetas, os teólogos e todo o Povo de Deus se abeirem dela por aquilo que realmente é: como Palavra de Deus que Se nos comunica através de palavras humanas (cf. 1Ts 2,13). Trata-se de um dado constante e implícito na própria Bíblia: „Nenhuma profecia da Escritura é de interpretação particular, porque jamais uma profecia foi proferida pela vontade dos homens. Inspirados pelo Espírito Santo é que os homens santos falaram em nome de Deus‟ (2Pd 1,20-21). Aliás, é precisamente a fé da Igreja que reconhece na Bíblia a Palavra de Deus; como admiravelmente diz Santo Agostinho, „não acreditaria no Evangelho se não me movesse a isso a autoridade da Igreja Católica‟. O Espírito Santo, que anima a vida da Igreja, é que torna capaz de interpretar autenticamente as Escrituras. A Bíblia é o livro da Igreja e, a partir da imanência dela na vida eclesial, brota também a sua verdadeira hermenêutica” (VD 29)



                                                   O FIM VEM

Os que não são cristãos tem dificuldade em acreditar que estamos vivendo nos últimos dias da história de esta Terra. A Bíblia diz em 2 Pedro 3:3-4 “Sabendo primeiro isto, que nos últimos dias virão escarnecedores com zombaria andando segundo as suas próprias concupiscências, e dizendo: Onde está a promessa da sua vinda? porque desde que os pais dormiram, todas as coisas permanecem como desde o princípio da criação.” A vinda do anticristo é um sinal do fim. A Bíblia diz em 1 João 2:18 “Filhinhos, esta é a última hora; e, conforme ouvistes que vem o anticristo, já muitos anticristos se têm levantado; por onde conhecemos que é a última hora.”
Que disse Jesus sobre quando o fim do mundo chegaría? A Bíblia diz em Mateus 24:14 “E este evangelho do reino será pregado no mundo inteiro, em testemunho a todas as nações, e então virá o fim.”
Nos últimos dias haverão homens fazendo-se passar por Jesus para nos enganar, A Bíblia diz em Mateus 24:23-24 “Se, pois, alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! ou: Ei-lo aí! não acrediteis; porque hão de surgir falsos cristos e falsos profetas, e farão grandes sinais e prodígios; de modo que, se possível fora, enganariam até os escolhidos.”
Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. A Bíblia diz em Mateus 24:29-30 “Logo depois da tribulação daqueles dias, escurecerá o sol, e a lua não dará a sua luz; as estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem, e todas as tribos da terra se lamentarão, e verão vir o Filho do homem sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória.”
Em que condição moral estará a nossa sociedade nos últimos dias? A Bíblia diz em 2 Timóteo 3:1-5 “Sabe, porém, isto, que nos últimos dias sobrevirão tempos penosos; pois os homens serão amantes de si mesmos, gananciosos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a seus pais, ingratos, ímpios, sem afeição natural, implacáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando-lhe o poder. Afasta- te também desses.”
Um aumento em conhecimento e habilidade de viajar é um sinal dos últimos dias. A Bíblia diz em Daniel 12:4 “Tu, porém, Daniel, cerra as palavras e sela o livro, até o fim do tempo; muitos correrão de uma parte para outra, e a ciência se multiplicará.”
Que outros sinais dos últimos dias menciona a Bíblia? A Bíblia diz em Lucas 21:25-26 “E haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas; e sobre a terra haverá angústia das nações em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas. Os homens desfalecerão de terror, e pela expectação das coisas que sobrevirão ao mundo; porquanto os poderes do céu serão abalados.”
Conversaçôes sobre paz e segurança é outro sinal dos últimos dias. A Bíblia diz em 1 Tessalonicenses 5:2-3 “Porque vós mesmos sabeis perfeitamente que o dia do Senhor virá como vem o ladrão de noite; pois quando estiverem dizendo: Paz e segurança! então lhes sobrevirá repentina destruição, como as dores de parto àquela que está grávida; e de modo nenhum escaparão.”
Que devem as pessoas fazer quando veem estes sinais? A Bíblia diz em Mateus 24:42-44 “Vigiai, pois, porque não sabeis em que dia vem o vosso Senhor; sabei, porém, isto: se o dono da casa soubesse a que vigília da noite havia de vir o ladrão, vigiaria e não deixaria minar a sua casa. Por isso ficai também vós apercebidos; porque numa hora em que não penseis, virá o Filho do homem.”
DEUS ABENÇOE VOCÊS TODOS   ASS;; LUCIA

terça-feira, 6 de agosto de 2013

               O Tempo do Cativeiro
O Tempo do Cativeiro
As narrativas sobre o tempo do cativeiro se constróem a partir da rememoração
de casos e histórias que os depoentes ouviram contar dos pais e avós. Nem sempre
estas histórias dizem respeito diretamente a experiências dos próprios contadores
originais (pais ou avós), mas falam antes de narrativas transmitidas de pai para filho
por serem conhecidas ou por ouvir dizer. Constróem de maneira coerente uma
memória coletiva sobre os significados da experiência da escravidão associada às
idéias de violência, torturas, maus tratos e animalização, bem como ao poder senhorial
e a seu arbítrio, para fazer o bem ou o mal. É a partir dessa representação genérica do
tempo do cativeiro que se organizarão os recursos de periodização nas narrativas
consideradas, emprestando significados precisos ao “tempo do cativeiro” e permitindo
aos depoentes refletirem criticamente sobre as suas continuidades e descontinuidades
com o tempo atual.
***
Meu pai foi do tempo da escravidão. Era duro o tempo da escravidão. Tinha
os administradores que tomavam conta deles. Era ruim principalmente para essa
mulherada que era escrava também. Diz que elas apanhavam lá. Surravam eles
todos, mas meu pai dizia que obrigavam elas a casarem com qualquer um. Acho que
era isso que minha tia falava, que era custoso o casamento pra elas lá . Esses
administradores eram muito ruins.
Eles apanhavam à toa, à toa, à toa, de ruindade mesmo, surravam. Faziam a
comida na gamela. A comida era toda na gamela. Aquela comida grosseira que eles
comiam. Ali era tudo ali na gamela. Diz que o feitor era ruim! O feitor que mandava
neles. Quem judiava dos escravos era o feitor. Sempre o feitor. O patrão mandava
tomar conta, ele fazia o que queria com.os coitados. Até a mulherada apanhava!
Mas agora vou te contar, em Tietê...tinha uma mulher que se chamava Nhá
Aninha. Ana. Ela era de Piracicaba, sabe? E tinha escravo. Ih! essa mulher pintava
com os escravos! Ela era ruim!
Mas eu estou contando...que eu conheço ainda lá a casa onde ela morava. Ela
gritava, gritava, gritava... O que Nhá Aninha fazia! Se pegava como diz ...até que
por fim do remato... ela criou rabo! Eu estou contando. Ela criou rabo!. O apelido
dela era Aninha Braba. E não é que uma vez ela jogou um caldeirão de gordura
quente num rapazinho? E o rapazinho morreu.
Diz que quando ela ficou ruim ela gritava: “Tira esse negrinho daqui! Eu não
quero ver esse negrinho! Tira o negrinho daqui!” E ela ficou ruim, criou rabo,
arrumaram uma cadeira de braço, grande assim (a depoente move os braços para dar
uma idéia do tamanho da cadeira), fizeram um buraco no meio. Ela não andava. Eles
punham ela sentada e uma das empregadas pegava aqui e a outra lá (uma de cada
lado da cadeira) pra levar ela na casa da gente rica que era conhecida dela. Seu
nome era Maria Silvia Paes de Andrade. Levavam ela na cadeira. E depois ela
morreu. E mesmo assim ainda gritava lá no cemitério para levar a corda pra ela,
corda pra enforcar os escravos. (Isabel Fabiano André, SP, 93 anos, 18/10/1987)
****
Não foi só negro que foi escravo, é que o negro foi a maior parte e era lei do
país que se podia comprar as pessoas. Então, aquele que ele comprou era um
escravo. Eu tinha uma tia, ela contava que a avó dela, veio de Cuiabá no comboio.
Você sabe o que é comboio? É a mesma coisa de dizer um lote, um bando, é aquele
mundo de negro, de todo tamanho, viu? O que prestasse pra andar fazia aquele
comboio. Vinham pelas estradas a pé. E aí, quando o comboio chegava lá, tinha
leilão de escravo. Tinha leilão, avisavam todos os fazendeiros da região. Aqueles
fazendeiro todos arrumavam dinheiro e falavam: “hoje tem leilão”. Ele ia lá e era
leiloado aquele escravo. Se era moço de dezoito anos ou uma rapariga de dezoito,
dezesseis, era mais caro. Se tinha doze, quatorze, era mais barato. Se era velho, um
 
escravo que era ruim, que não era grande coisa pra trabalhar, esse era mais barato.
Era assim. E eles preferiam sempre comprar aqueles de dezoito, vinte, ou meio
moço.
Teve um fazendeiro que comprou um moço que chamava Lourenço. E
quando ele trouxe em casa o Lourenço falou assim pra ele: “Vamos ver sua língua!”
“Tira a língua pra fora que eu quero ver sua língua.” Aí o Lourenço tirou a língua
pra fora, ele pegou um ferro quente e...disse: “você tem jeito de ser linguarudo”, e
queimou a língua dele com ferro quente! Foi a primeira judiação. Era pra dar
exemplo pros outros. Pra dar exemplo pros outros. Esse que queimou a língua não
era meu parente, mas a gente sabe a história dos senhores. Sabe, o nosso pai
contava, os avôs contavam histórias de um senhor, de outro. Tinha o que era bom,
tinha o que era ruim... E eles contavam pra nós, pra netaiada. (Benedita, SP, 80 anos,
15/08 e 16/08/1987)
***
A minha avó foi escrava. A minha mãe nasceu um ano depois do cativeiro.
Minha avó contava que eles foram muito judiados, apanhavam muito, que a
“escravidão” tinha tirado o coro das costas deles.
Os escravos não sabiam idade. Mas ela não morreu muito velha não, porque
ela era lúcida e contava o que eles passavam no cativeiro, os flagelos. Eu ouvi dizer
que tinha tronco. Só que ela dizia que nunca foi no tronco, mas que os outros iam.
Nesse território aqui tudo foi trabalhado, foi feito pelos escravos. Naquele tempo o
trem era feio. Se não trabalhava, apanhava, morria até, porque os outros batiam
mesmo. Ouvi falar muito isso. (M.L.F., ES, nascida em 1916, não consta a data da
entrevista)
***
Ah, mamãe contava muito caso do tempo do cativeiro. Lá em Petrópolis, na
fazenda em que ela foi criada, nascida e criada, chamada fazenda do Grão-Pará,
tinha um fazendeiro que era muito ruim. Ele tinha um esteio assim dessa grossura.
Quando o nego errava, ele botava ele ali, na roda de açoite. Aqui... quando ele
gritava, um coro vinha de lá, batia aqui. O outro coro vinha de cá, batia aqui.




 Quando tirava o nego dali, estava todo retalhado. . (C.M.S., E.S., 75 anos,
04/07/1995)
***
Meu avô falava muito sobre aquele negócio de bater nos negros. A roda de
chicote que corria aqui. Um dia ele estava mostrando um toco de porteira desse
tamanho assim. Então ele falou que debaixo daquele tronco de porteira tinha um
negro enterrado. Ele disse que o patrão, o chefe, quando tomava raiva do cara,
levava o cara pra lá sem saber de nada e mandava ele furar um buraco pra colocar
um batente de porteira. Quando o buraco tava fundo, aquele buracão assim, aí diz
que ele mandava o cara ir lá embaixo, jogando a terra pra cima e aí ele mandava
jogar o esteio de porteira em cima dele. Jogava aquele esteio de porteira em cima
dele lá, aquele toco de braúna desse tamanho, dessa grossura assim, e socava, ali,
botava e falava: “Ó, se vocês falarem vocês vão morrer também”. Diz que ninguém
falava. Meu avô contava que aqui debaixo dessa porteira tem um crioulo morto,
enterrado aqui. E que logo pra baixo tem um riozinho que desce e uma basezinha de
pedra onde ficava a senzala e o lugar de bater nos negros. (A.D.C., ES)
***
Agora tem mais outros casos de escravidão que aconteceu aqui em Cunha.
Meu pai contava de um escravo com nome de Israel. Esse é outro causo. Um
escravo com nome de Israel. Ele tinha o sinhô, o patrão dele que era o Manuel
Antônio. Muito severo, muito ruim, homem cruel, triste! Era daqui de Cunha, aliás a
fazenda mais bonita que existe no município de Cunha era desse homem. Manuel
Antônio. Ele era um patrão que castigava mesmo por gostar. Dizem que ele
experimentava espingarda atirando numa criancinha em cima dum cupinzeiro, em
cima duma cerca, atirava pra experimentar a espingarda. Dizem isso. E esse Israel
foi vendido para ele. Dona Geralda vendeu os escravo pro Manoel Antônio. Manoel
Antônio comprou os escravos porque era uma dívida que ela devia e no meio desses
escravos foi o tal Israel.
Esse o meu pai conheceu na prisão. Um dia que o capataz foi buscar os
pretos para dar uma bordoada na cabeça, porque era a moda que o tal Manuel
Antônio mandava eles fazer, ele mandava prender num paiol grande de milho e dar



 uma bordoada na cabeça, aí o escravo caía e ele amarrava. Então, quando foi na vez
do Israel, o capataz deu a bordoada e o Israel caiu, mas o capataz não sabia que ele
estava com uma peixeira por baixo da camisa. Então, quando o Israel caiu e ele
montou em cima do escravo pra amarrar, o Israel cutucou na boca do estômago e
matou o capataz. Ele morreu em cima do escravo. Deu uma confusão medonha, meu
pai contou. Agora depois prenderam o Israel na cadeia. Ele morreu com bicho na
cabeça, porque nesse tempo não cuidavam dos preso. Deu um corte na cabeça dele
com a bordoada que deram...
Mas no meio deles existia também senhor de escravo que era bom, como o
sinhozinho, marido de Dona Geralda, fazendeiro rico, milionário, gente bem de vida.
Esse dizia: “meus filhos vem vindo”. Aliás tem um outro causo inteiro, do dia que
um pessoalzinho, o promotor, o delegado assim, as autoridades, foram almoçar
nessa fazenda, na fazenda do sinhozinho.
Lá chegando, eles puseram a mesa, mas não arrumaram a comida, e o
sinhozinho dizia: “meus filhos estão demorando!” e eles pensavam, o pessoal das
autoridades pensava que “meus filhos” eram os filhos mesmo dele. Então lá de
longe, ele apontou os pretos cantando que vinham do eito. Os pretos cantando e ele
falou: “Ah! Então põe a janta na mesa porque meus filhos estão chegando”. Os
filhos dele eram os escravos. Ele tinha como filhos os escravos, porque os escravos
ajudavam a vida dele. Ajudavam ele a ganhar o dinheiro, ajudavam em tudo, então
ele tinha como filho.
É aonde eu digo que eles eram bons e eram ruins, tinha gente boa e tinha
gente ruim no meio, sabe?
Mas a verdade é que é doido a gente ver um ser humano castigado e jogado
pro porco comer como existiu aqui em Cunha. Tratado como animal. Os escravos
eram tratados como animal. Tem até um ditado que diz que o preto que tinha canela
fina era bom pra trabalhar, o preto da canela grossa não prestava pra trabalhar. Esses
eles matavam e não tinha crime. A escravidão não pode ser boa não. Era um
sofrimento pro povo. Um ser humano sofrendo uma injustiça daquela. Porque todo
mundo é filho de Deus, preto ou branco, amarelo, tudo é filho de Deus. E nesse
tempo não, preto não valia nada, era tratado como bicho. Preto era tratado como




 O Tempo do Cativeiro 6
animal, bicho e sendo que ele é filho de Deus também, não é? (José Veloso
Sobrinho, SP, 70 anos, 16/07/1987)
***
Os negros do mato
Na tradição familiar aqui considerada, a fuga, apesar de compor, lado a
lado com o arbítrio senhorial, o quadro mais genérico do tempo do cativeiro,
apresenta-se como recurso de desespero ou de irresponsabilidade, com custo
altíssimo para quem a ele recorresse. Das punições mais cruéis ao serem
recapturados ao total desenraizamento dos negros do mato transformados em
caiporas. Os negros do mato – quase tão estrangeiros e ameaçadores quanto os
africanos – diferentemente destes não conseguiam levar a melhor sobre a
crueldade dos senhores, na visão dos nossos narradores.
***
Lá onde ele estava escravo não fugia. Mas eu vi falar que nos outros lugares
fugiam. Fugiam de noite. Quando o patrão procurava, cadê? Onde estava? Estava na
outra fazenda. Alguém ia procurar, ia buscar, trazia e tacava na forca. (Isabel
Fabiano André, SP, 93 anos, 18/10/1987)
***
Tinha um fazendeiro aqui com nome de... da família Pereira. E esse, ele tinha
um escravo na família. Esse é o causo da escravidão, um escravo na família, um
escravo que usava fugir muito. O velho Nhozinho Pereira, eu conheci. Agora o
escravo eu não conheci. Agora esse escravo chamava Prudente e esse tal de
Prudente fugia. Fugia muito. Volta e meia... acontecia qualquer coisinha lá, ele se
aborrecia, ele fugia. Fugia para o mato. E o sinhô pegava ele, seu Pereira velho,
pegava ele, agradava ele, mas não judiava. Não chicoteava, não judiava dele. Depois
nasceu um filho que foi crescendo, ficou moço, nasceu um filho do Pereira que era o
sinhozinho Pereira. Esse, depois que o Pereira morreu, falou para o escravo:
“Prudente, você não fuja mais que eu já estou moço e o dia que você fugir, eu te
corto as orelhas”. Então ele fugiu um dia. O nhozinho Pereira cortou as duas orelhas
dele, cortou rente. Ele andava e o vento atrapalhava. Ele não escutava direito. Ficou



 O Tempo do Cativeiro 7
desortinado, meio pertubado. Esse é o causo da escravidão que um dos escravo
sofreu muito. Um escravo sem orelha é penoso, porque a orelha ajuda o vento não
atrapalhar e também o ouvido, não é? E esse coitado ficou sem, sem orelha. (José
Veloso Sobrinho, SP, 70 anos, 16/07/1987)
***
Aqui tinha uma capela numa fazenda de nome Conceição. Tem uma capela
ainda, lá nesse lugar. Ali foi matado um menino. Quando terminou o cativeiro, o
menino já levava almoço para o pai. O cativeiro tinha acabado, mas tinha gente nas
matas que não sabia que o cativeiro tinha acabado. Então ficava dentro do mato
escondido.
O menino foi passando com o almoço para o pai, porque não tratava mais de
cativeiro, já tinha criança que levava almoço, essa coisa e tal, todo mundo já estava
trabalhando à vontade, mas quem estava no mato não estava sabendo daquilo, que o
cativeiro já tinha acabado. Chamava caipora, essas pessoas que estavam escondidas
no mato, chamava caipora. Tinham muitos caiporas na mata, meu pai me falou, era o
pessoal que fugia. Para pessoa não fugir, eles usavam naquele tempo - e eu ainda
cheguei a ver também isso, isso eu cheguei a ver, tive a oportunidade de ver na casa
de um homem que chamava Zacarias, que ele também era do cativeiro, ele tinha na
casa dele guardado um tronco de pescoço. Botava no pescoço, botava uma cruz
assim em cima e tinha um gancho do lado e do outro que parecia uma cruz, que
aquilo se a pessoa entrasse no mato, agarrava no mato, então não tinha como a
pessoa andar no mato, só na estrada, em lugar limpo. Então esse menino ia passando
com o almoço, esse caipora que estava na beira do caminho pegou a moringa do
menino e matou o menino com um toco de braúna. Eu cheguei a ver esse toco de
braúna. Matou o menino com o toco de braúna para pegar comida, chamava Manoel,
esse menino. Pegou a comida e comeu. O menino ficou morto na beirada, pegaram
esse menino e enterraram. Tinha um cemitério aqui perto, tinha um cemitério, ainda
posso ver onde é que é, ainda cheguei a ver cruz naquele lugar. Cruzes de madeiras
naquele lugar de braúna. Então enterraram o menino ali. Então passou o tempo e
foram desenterrar o menino. O menino estava com o corpo molezinho. Depois
trouxeram o menino, o menino estava saindo sangue, ainda dava sangue depois d

mais de uns 10 anos, o menino estava saindo sangue. Pegaram o menino e levaram o 
menino para Roma. O padre levou o menino para Roma e ele virou santo.(Izaquiel
Inácio, Rio de Janeiro, 72 anos, 19/09/1994)


ESCRAVIDÃO E RESISTÊNCIA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A 
ESCRAVIDÃO NO MATO GROSSO SÉCULO XVIII E XIX*
VIANA, Fabiane Filgueiras**
Introdução
Este artigo se propõe a discutir sobre a escravidão no sul e norte de Mato Grosso 
no século XIX, entretanto alguns dados remetem-nos inevitavelmente ao século XVIII. Como 
sabemos, da colônia ao Império as mesmas estruturas permaneceram, dentre elas, a estrutura 
de dominação do homem sobre o homem, do branco sobre o negro. 
Pretendemos tecer aqui algumas informações acerca deste assunto, utilizando 
como base Relatórios de Província de Mato Grosso e bibliografia especializada, além de 
outras fontes. Por isso, nossa proposta é fazer uma história vista de baixo, em que
reconheceremos a existência de outros sujeitos que também ajudaram a construir nossa
história. Iremos também salientar a respeito da formação dos quilombos e de outras práticas 
de resistência, e refletiremos brevemente sobre como a reconstituição de nossa história 
regional irá influenciar na formação de uma identidade própria que respeite as várias formas 
de cultura.
História vista de baixo



Lendo o poema de Berthold Brecht , perguntas de um trabalhador que lê, 
pensamos naqueles que com esforço ajudaram a construir a história, mas que por ela foram 
ignorados, e concluímos que, realmente, como diz o poema, são tantas histórias, e tantas 
questões que ainda permanecem. Deste modo, este artigo pretende fazer uma história vista de 
baixo, baseado nas reflexões de Jim Sharpe, ao buscar valorizar as experiências das classes 
sociais menos favorecidas, das classes que vem de baixo, das classes que estão situadas à 
margem da sociedade e da historiografia; reconstruindo a história dos trabalhadores escravos
e suas vidas, suas lutas e aspirações, compreendendo que a história dessas pessoas, mesmo 
localizadas em um espaço restrito, está situada em um plano maior, que existiu em todo o país 
durante 300 anos: a escravidão de africanos no Brasil. 
Pretende-se contar a história daqueles que remaram nas canoas rio a baixo, rio 
acima, daqueles que plantaram roças, que trabalharam em minas, foram trabalhadores urbanos 
* Este trabalho foi realizado a partir das avaliações da disciplina História do Brasil III, ministrada no curso de 
História, pela Profa. Dra. Maria Celma Borges, CPTL/UFMS.
** Acadêmica do sétimo semestre do curso de História – UFMS/CPTL.529
e domésticos, daqueles que construíram quilombos, daqueles que resistiram. Estamos falando 
dos escravos de uma região que até bem pouco tempo atrás se afirmava não ter existido 
escravidão, pelo menos não de uma forma expressiva, a região de Mato Grosso e sul de Mato 
Grosso. 
Mas eles estavam lá. Como mostra um relatório de província do estado de Mato 
Grosso1



a respeito de um censo realizado na província aquele ano. Segundo o relatório, 
naquele ano foram realizados 13 casamentos entre escravos na freguesia da cidade de Cuiabá. 
Ao todo, em todo estado foram realizados 30 casamentos. Um forte indício da existência da 
família escrava. Entretanto não sabemos se a família escrava identificada acima era de tipo 
nuclear, com pai, mãe e filhos vivendo sobre o mesmo teto. Segundo Robert Slenes, nas 
uniões de casamento entre escravos, os filhos que nascessem destas uniões poderiam passar 
apenas seus primeiros anos de vida em companhia dos pais. Identificamos em Mato Grosso, 
na Sociedade de Mineração de Diamantino a existência de famílias escravas (ou pelo menos, 
só o registro das mães) nas quais os filhos não permaneceram em companhia dos pais.
No mesmo relatório, aparecem ainda outras informações, como, por exemplo, o 
número de batismos e de óbitos entre os escravos. Em Cuiabá, 30 escravos e 34 escravas 
foram batizados, seguido pela Vila de Diamantino com 38 escravos, sendo 25 homens e 13 
mulheres. No total foram 95 homens e 80 mulheres. O número de escravos homens supera o 
número de mulheres, mas não é uma diferença muito grande.
Sobre a densidade de escravos na província, é possível afirmar segundo os dados 
demográficos extraídos do artigo de Maria Machado, a respeito da população escrava de Mato 
Grosso no século XVIII, que logo no início da administração da província (desmembrada da 
capitania de São Paulo ) esta já contava com 1.175. Em 1780, três quartos dos habitantes da 
capitania eram negros ou mulatos ou mestiços. Sobre a procedência desses escravos, observa 
a autora que:
De modo amplo, através de dados esparsos, podemos concluir que, comparado com a 
população de outras capitanias, a população de escravos de Mato Grosso era em geral 
mais masculina do que feminina, pois era comprada no Rio de Janeiro, na Bahia, Minas 
Gerais e no Pará... (MACHADO, 2006, p. 10)
Conforme já mencionado, não é possível que estes escravos batizados tenham 
nascido na região, pois a baixa natalidade entre eles era fato notório, e mais, naquela época,
1


FALLA 1839. Mapa 4.530
ainda não estava em voga a lei de 1850, que proibia terminantemente o tráfico transatlântico 
de escravos. Provavelmente eles vieram direto da África para os portos do Brasil, onde os 
senhores que os compraram trouxeram-nos para a região de Mato Grosso e desse modo, assim 
que tomaram “posse” dos escravos, esses senhores, imediatamente os mandaram batizar, pois 
como segundo consta nas Ordenações Filipinas , livro V, capítulo 99 :
Mandamos que qualquer pessoa, de qualquer estado e condição que seja que escravos 
de Guiné tiver, os faça batizar e fazer cristãos, do dia que a seu poder vierem até seis 
meses, sob pena de os perder para quem os demandar. E se algum dos ditos escravos 
que passe de idade de dez anos(*) se não quiser tornar cristão, sendo por seu senhor 
querido, faça-o seu senhor saber ao prior ou cura da igreja em cuja freguesia viver, 
perante o qual fará ir o dito escravo; e se ele, sendo pelo dito prior e cura admoestado e 
requerido por seu senhor, perante testemunhas, não quiser ser batizado, não incorrerá o 
senhor em dita pena.2
Ainda sobre a densidade populacional dos escravos na província , um outro 
Relatório de Província de 1849, realizado por Joaquim Feliciano de Almeida Louzada, que 
realizou um senso da província para aquele ano, consta que a população geral da província era 
de 32.833 pessoas, sendo 10.886 escravos e 21.947 pessoas livres. Esta informação nos 
evidencia que o número da população escrava era quase a metade do contingente populacional
branco da província, fato este que nos revela a alta densidade de escravatura em uma região 
que até então, era considerada quase esquecida do resto do pais e sua população escrava era 
considerada inexpressiva. Embora, não podemos deixar de evidenciar que a economia ( 
baseada primeiramente na mineração e depois na pecuária )de Mato Grosso a época não era a 
mesma de outras regiões do país, como norte ou sudeste, e por isso a população de escravos 
em Mato Grosso era menor do que nessas mesmas áreas, mas que de maneira nenhuma pode 
ser considerada inexpressiva -nos mesmos moldes da estrutura escravista do país, a 
escravidão nesta província manteve suas especificidades. Na cidade de Cuiabá, os números
2
Ordenações Filipinas. Batismo de escravos. Ordenações Filipinas, Livro V, capítulo 99, 1603 1. E sendo os 
escravos em idade de dez anos ou de menos, em toda a maneira os façam batizar até um mês do dia que 
estiverem em posse deles; porque nestes não é necessário esperar seu consentimento. 2. E as crianças que em 
nossos reinos e senhorios nascerem das escravas que das partes de Guiné vierem, seus senhores as farão batizar 
aos tempos que os filhos das cristãs naturais do Reino se devem e costumam batizar, sob as ditas penas.» (*) 
onde consta que segundo as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia a idade mínima para poder 
escolher a religião era de sete anos. FONTE: Silvia Hunold Lara (organização), Ordenações Filipinas, Livro V. 
São Paulo: Companhia das Letras. 1999. p. 308. Coleção Retratos do Brasil, 16.
2 Relatório do Presidente da Província de Mato Grosso, o major doutor Joaquim José de Oliveira, na abertura da 


Assembléa Legislativa Provincial em 3 de maio de 1849. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e 
Comp., 1850.531
eram ainda mais evidentes, sendo que a população escrava era quase a mesma que de pessoas 
livres, 2.846 para 2.646 3
Ausências
Como dissemos anteriormente, esses sujeitos estavam lá e não só da história eles 
foram renegados, mas inclusive dos hinos dos estados nos quais ajudaram a construir. 
Apresentamos abaixo um trecho do hino de Mato Grosso do Sul. O passado sul matogrossense de escravidão tem sido rejeitado ( ou negado) por aqueles que fomentaram a 
divisão dos estados: Moldurados pelas serras/ Campos grandes: Vacaria/ Rememoram 
desbravadores,/ Heróis, tanta galhardia.
Desbravadores, heróis, bandeirantes, é deste modo e com esses nomes que a 
História tradicional tem chamado e rememorado aqueles que são considerados os pioneiros a 
adentrar em tão densa e inóspita região do „oeste‟. Agora, cabe perguntarmo-nos: Quem foi 
que realmente derrubou as matas? Quem foi que remou as canoas? Quem foi que plantou as 
roças?
Os Garcia Leal
José Garcia Leal é considerado um desses „desbravadores‟. Se instalou na 
região por volta de 1836, desenvolvendo a atividade pastoril, é reputado com um dos 
principais homens do sertão mato-grossense, seus descendentes tiveram ligação com a 
constituição de cidades ao sul de mato grosso, inclusive a cidade de Três Lagoas. Nas 
localidades desta, estava instalado um descendente seu, Protázio Gracia Leal. As histórias 
desses homens muitas vezes foram consideradas verdadeiras epopéias. Mas, de acordo com os 
estudos da historiadora Zilda Alves de Moura, Januário Garcia Leal, assim como outros 
proprietários de terra em todo o país, também possuía escravos. Zilda Moura, citando 
Campestrini afirma que José Garcia Leal “tornou-se um grande fazendeiro, possuidor de 
gado, engenhos e cativos”.4
Seus trabalhadores cuidavam do gado, faziam farinhas e outras atividades próprias 
da vida do campo. José Garcia Leal concedeu inclusive cartas de alforrias a muitos de seus 
escravos, como afirma a autora porém, as revogou anos depois, por se sentir ameaçado, já que 
os escravos receberiam a tão sonhada liberdade com a morte de seu senhor.
3 Relatório do Presidente da Província de Mato Grosso, o major doutor Joaquim José de Oliveira, na abertura da 
Assembléa Legislativa Provincial em 3 de maio de 1849. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e 
Comp., 1850.
4 MOURA.2008. p.229


domingo, 10 de junho de 2012

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